Este foi um dos principais pedidos feitos pela promotora de Justiça Fabiana Lemes Zamalloa do Prado, em ação civil pública protocolada na terça-feira (23/10) contra o Estado de Goiás e distribuída para a 2ª Vara da Fazenda Pública Estadual.
Também foram acionadas sete organizações que atualmente gerenciam unidades de saúde no Estado: Fundação de Assistência Social de Anápolis (Fasa), Associação Beneficente de Assistência Social e Hospitalar (Pró-Saúde), Associação Goiana de Integralização e Reabilitação (Agir), Instituto de Desenvolvimento Tecnológico (Idtech); Instituto de Gestão em Saúde (Iges), Instituto Sócrates Guanaes (ISG), e o Instituto de Gestão e Humanização (IGH).
Os hospitais gerenciados são, respectivamente: Hospital de Urgências de Anápolis (Huana), Hospital de Urgências da Região Sudoeste de Goiás (Hurso), Centro de Reabilitação e Readaptação Dr. Henrique Santillo (Crer), Hospital Geral de Goiânia (HGG), do Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo), Hospital de Doenças Tropicais (HDT) e Hospital Materno Infantil (HMI).
Princípios burlados
Conforme sustenta a promotora, a partir dos contratos celebrados com as organizações sociais para a gerências de praticamente todos os hospitais públicos do Estado, a administração estadual torna vulnerável o princípio da universalidade, da integralidade e da igualdade, que estão na base do Sistema Único de Saúde (SUS). Ela acrescenta que, na atual conformação, o Estado de Goiás “comprou” um pacote de serviços por preço determinado, sem levar em conta os graus de complexidade dos serviços efetivamente prestados e, ainda, sem a participação do Conselho Estadual de Saúde.
Apesar de os Conselhos de Saúde deverem, necessariamente, participar das decisões sobre as políticas públicas de saúde no âmbito das três esferas de governo, não sendo órgãos meramente consultivos, a decisão do Estado contraia a Resolução nº 223/1997. “Evidente que uma mudança como a efetivada pelo Estado de Goiás não poderia olvidar ou desconhecer a posição do Conselho Estadual de Saúde”, pondera.
Fabiana Zamalloa observa ainda que, a pretexto de buscar maior eficiência na prestação de serviços de saúde, os contratos constituem, em verdade, burla ao princípio da complementariedade da atuação da iniciativa privada no SUS.
Por este princípio é permitida a participação de entidades privadas sem fins lucrativos no SUS, de forma complementar, com a finalidade de suprimir a insuficiência da capacidade de prestação de serviço de saúde. Não sendo possível, portanto, a transferência da gerência de todos os equipamentos públicos de prestação de serviços de média e alta complexidade do Estado, observa a promotora.
Dever constitucional
Segundo observado na ação, se o Estado possui os equipamentos públicos, assim entendidos como toda a estrutura material para a prestação dos serviços de saúde, se possui um quadro próprio de pessoal, em tese devidamente qualificado, e dispõe de vultosos recursos financeiros (hoje os contratos de gestão já consomem montante superior a R$ 370 milhões anuais), fica claramente demonstrado que pode prestar diretamente os serviços de saúde que colocou sob a administração de organizações sociais.
“O Estado de Goiás optou por transferir a gerência da sua capacidade instalada para entidades de direito privado que em nada vão agregar aos serviços que hoje podem ser prestados pelo governo estadual, numa clara demonstração de que, embora possa, não quer desempenhar o ônus constitucional”, afirma a promotora. Ela argumenta ainda que, segundo determinação constitucional e legal, o Estado tem o dever de prestar diretamente serviços de saúde gratuitamente à população, tendo em vista a natureza básica e essencial da atividade.
Além disso, conforme extraído dos contratos de gestão celebrados, os serviços são pré-pagos, em parcelas mensais, independentemente da sua efetiva prestação. Ou seja, o repasse mensal feitos às OS é fixo, mesmo que as entidades não cumpram as metas propostas, sem qualquer mecanismo de controle dos gastos e do empregos dos recursos públicos pelas organizações, em afronta ao que prevê a Constituição.
Outra apuração
Quanto aos recursos humanos, apesar de o Estado de Goiás dispor de quadro próprio de profissionais da saúde, selecionados por concurso público que aguardam, inclusive, nomeação, os contratos preveem a possibilidade de as organizações sociais contratarem 50% dos empregados de forma direta, por meio de contrato regido pelas regras celetistas, portanto, sem concurso público. Em razão disso, muitos servidores públicos estão sendo removidos das unidades de saúde em que as OS assumiram a gerência. Contudo, essa situação é objeto de investigação no inquérito civil público nº 22/2012, em tramitação na 89ª Promotoria de Justiça.
Universalidade
Também é citado pela promotora Fabiana Zamalloa na ação, o risco de que, ao manter os serviços da forma como estão contratados, haverá uma inevitável “seleção” dos pacientes, encaminhados pelo sistema de regulação, deixando sem atendimento aqueles “mais onerosos” para a organização social. Prevendo uma possível situação, é citado que um paciente com probabilidade de complicações, de permanência em UTI por tempo maior do que a média prevista no contrato, com necessidade de ações e serviços em quantitativo maior do que a “média” contratada ou cujo tratamento demande medicamentos de alto custo. Essa situação representaria maior ônus à OS, que possivelmente não poderá assumir, sob pena de não conseguir, com os valores pactuados, cumprir as metas assumidas no contrato de gestão.
Liminares
Segundo reiterou a promotora, embora flagrante a nulidade dos contratos de gestão celebrados pelo Estado de Goiás, uma medida liminar que determinasse a suspensão imediata de tais contratos poderia causar muitos prejuízos a todos os que dependem das ações e serviços de saúde prestados pelo Estado. Assim, além da antecipação de tutela para impor ao Estado a proibição de renovar ou prorrogar os contratos já celebrados, é requerida ainda a proibição da celebração de novos contratos de gestão, nos moldes dos que estão sendo celebrados atualmente.
Liminarmente, também é pedida a imposição da obrigação de o Estado reassumir as ações e serviços de saúde nos hospitais públicos estaduais à medida que expirar o prazo de validade dos contratos de gestão vigentes.
No mérito da ação é requerida a declaração de nulidade dos contratos de gestão 001/2010 e seus aditivos, firmado com a Fasa; o 120/2010 e seus aditivos, celebrado com a Pró-Saúde; o 123/2011 e seus aditivos, firmado com a Agir; o 024/2012 e seus aditivos, firmado com o Idtech; o 064/2012 e seus aditivos, firmado com o IGES; o 091/2012 e seus aditivos, celebrado com o ISG, e o 132/2012 e seus aditivos, firmado com o IGH.
Fonte: Comunicação CES-GO
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