Nesta década o Brasil terá oferta abundante de energia elétrica limpa e barata, baseada, sobretudo na expansão da geração hidrelétrica, eólica e termelétrica a gás natural. Para o mercado, é a grande chance de o governo transformar esse cenário favorável em benefício efetivo para o bolso do consumidor, que paga hoje uma das contas de energia mais caras do planeta. Isso, porém, passa pelos encargos e impostos do setor elétrico. E pela postura do Planalto em relação à RGR, que deveria ter sido extinta em dezembro passado, mas foi prorrogada por mais 25 anos, um futuro de tarifas módicas ainda parece longe de se tornar real.
De acordo com o Plano Decenal de Expansão de Energia 2020 (PDE 2020), a capacidade instalada hidrelétrica crescerá quase 40%, atingindo 115,1 mil MW. A capacidade eólica aumentará dez vezes, chegando a 11,5 mil MW instalados, e a preços competitivos, como os R$ 99,58 e R$ 99,54 por megawatt-hora obtidos nos leilões A-3 e de reserva, respectivamente, realizados em agosto. E embora o PDE não trace uma expansão significativa para a termeletricidade a gás, que passaria de 9,18 mil MW para 11,6 mil MW, o presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, admite que a fonte ganhará força nos próximos anos.
Tudo por conta das previsões de grande oferta e queda do custo do energético – no A-3 de agosto, o preço médio da fonte foi de R$ 103,26/MWh. O fato é que o custo da energia elétrica no Brasil vai mesmo cair. Basta lembrar que nos últimos anos foram leiloadas quatro grandes hidrelétricas, num total de 19,9 mil MW, a preços baixos: Santo Antônio (R$ 96,71/MWh), Jirau (R$ 85,10/MWh), Belo Monte (R$ 84,17/MWh) e Teles Pires (R$ 61,10/MWh), em valores já atualizados.
Se o futuro promete geração barata em expansão, o lado da demanda não dá sinais de que crescerá a ponto de pressionar preços. Pelo contrário: os indícios de um agravamento da situação econômica mundial, mesmo com reflexos ainda tímidos na indústria brasileira, vêm fazendo o PLD “beijar a lona”, atingindo parcos R$ 13/MWh em pleno período seco.
A queda do preço pode ser comprovada por um estudo feito pela Firjan com base no preço-teto do A-3 de agosto (R$ 139/MWh). A pesquisa indicou uma tarifa média para o consumidor industrial cativo de R$ 280/MWh, inferior à tarifa média atual para o segmento, de R$ 329/MWh. E se a oferta aumenta e a demanda não, por que o preço não cai para o consumidor?
O peso dos encargos
O valor verificado pelo estudo da Firjan, porém, coloca o Brasil entre as dez tarifas mais caras, em um grupo de 27 países analisados. E com preço de energia muito superior ao dos concorrentes diretos, como Índia (R$ 188,10/MWh), China (R$ 142/MWh) e Rússia (R$ 91,50/MWh).
Por conta disso, a pesquisa corrobora a opinião do mercado, que não acredita que essa avalanche de energia barata será efetivamente sentida pelo consumidor. A principal razão é a famigerada e pesada carga de tributos e encargos, que responde por algo entre 45% e 50% das tarifas de energia. “No Japão, que usa fontes mais caras de energia, o consumidor paga menos do que aqui, porque impostos e encargos somam apenas 8%”, ressalta o presidente da Abrage, Flávio Neiva.
Assim, para o setor industrial, mais sensível às tarifas elétricas, o cenário não é nada animador. As indústrias que estão no mercado cativo das distribuidoras pagam uma tarifa alta, fruto sobretudo do fim do subsídio cruzado, que até meados da última década dava um desconto na tarifa industrial, pago pelos consumidores residenciais.
A sensação não é diferente no mercado livre. As mesmas hidrelétricas arrematadas a preços baixos venderão 30% de sua energia no ambiente livre a valores bem superiores aos fechados nos leilões. “O mercado livre está subsidiando o regulado”, diz Erik Eduardo Rego, da consultoria Excelência Energética, indicando uma espécie de inversão do subsídio cruzado aplicado no passado.
Um exemplo gritante do estrago causado pela tarifa elétrica brasileira é a Rio Tinto Alcan. A companhia vai investir US$ 4 bilhões na construção de sua maior planta de alumínio no Paraguai. Para o assessor da diretoria da Abrace, Fernando Umbria, pesou na decisão o baixo custo da energia daquele país. O curioso é que, numa análise grosseira, Brasil e Paraguai têm a mesma fonte de energia: a hidrelétrica de Itaipu (14 mil MW).
Brasil Energia / Rodrigo Polito