Fabiana Pulcineli
O risco de ter a concessão cassada por conta da má gestão financeira volta a rondar a Celg. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) retomou no mês passado procedimentos que visam à análise de possível abertura de processo de caducidade (extinção da concessão).
A Aneel enviou à Celg, no dia 16 de junho, amplo documento, chamado Termo de Intimação, que determina prazo de 30 dias para apresentação de defesa e de plano de ações que estabeleça "180 dias para correção definitiva das falhas e transgressões à legislação e ao contrato de concessão".
O POPULAR teve acesso com exclusividade ao documento, de 146 páginas, que detalha a situação financeira da Celg, com quase R$ 7 bilhões de dívidas, e aponta para grandes dificuldades de equilíbrio das contas.
O relatório feito pela Superintendência de Fiscalização Econômica e Financeira (SFF) da Aneel destaca o desequilíbrio: "A combinação de baixa eficiência operacional com custo financeiro do elevado endividamento dificulta cada vez mais a perspectiva de saneamento financeiro da concessionária".
Ao final, lembrando as sucessivas tentativas de negociação da estatal goiana, a superintendência recomenda: "Tendo em vista a recorrência de insucessos de todos os planos econômico-financeiros, esta superintendência recomenda o início do processo de caducidade da concessão da Celg, com objetivo de evitar o agravamento da situação financeira que prejudica toda a sociedade (agentes do setor elétrico, consumidores e contribuintes)".
O relatório da agência reguladora afirma que o endividamento líquido de curto e longo prazo em 31 de dezembro de 2010 corresponde a 31,1 vezes a geração de caixa bruta operacional do exercício de 2010. "Neste patamar de solvência, a Celg é tecnicamente incapaz de honrar com suas obrigações de caixa", afirmam os técnicos.
O documento inclui dados sobre fiscalizações da agência e problemas da Celg desde 1999 até o primeiro quadrimestre deste ano.
negociações
A avaliação da concessão já havia sido incluída na pauta de reunião da diretoria da Aneel em abril do ano passado, inclusive com designação do relator, mas foi retirada por conta dos avanços nas negociações entre governos estadual e federal para solucionar os problemas da companhia.
Na ocasião, o Estado submetia à Assembleia Legislativa projeto de lei que autorizava empréstimo de R$ 3,7 bilhões para aplicação na Celg. Tratava-se da quinta proposta de recuperação da empresa desde 2002.
Depois de eleito governador, Marconi Perillo (PSDB) atuou fortemente contra o acordo ameaçando não cumprir o contrato com a Caixa Econômica Federal. O tucano era contrário ao repasse de parte da primeira parcela do empréstimo para o caixa do Estado, em referência ao ICMS devido pela Celg. Na visão de Marconi, o governo deveria fazer encontro de contas e aplicar todo o empréstimo na companhia.
A operação foi cancelada e, desde o início do ano, o governo já apresentou três propostas de recuperação para a estatal goiana. A última tentativa de negociação prevê acordo com a Eletrobras para transferência de parte das ações como compensação de uma parcela da dívida, de quase R$ 2 bilhões. Segundo o governo, ainda não houve resposta por parte da estatal federal.
A Eletrobras manifestou interesse em obter a maior parte das ações da Celg, mas o governo garante que mantém o compromisso de não estudar a federalização ou privatização da companhia.
processo
A assessoria de imprensa da Aneel informou à reportagem que as solicitações feitas pela Aneel fazem parte de uma fase de fiscalização econômico-financeira, que reúne dados para avaliar a necessidade de abertura de processo de caducidade.
Segundo a assessoria, a instauração ou não do processo é decidida pelos diretores em reunião, mas não há previsão para análise do caso Celg. A assessoria também destaca que cabe à Aneel apenas a recomendação de cassação e que a palavra final é do Ministério de Minas e Energia.
A equipe da Aneel informou ainda que não poderia dar detalhes da fase atual porque ela ocorre em sigilo. A assessoria também não esclareceu o que motivou a retomada dos procedimentos que visam à abertura do processo.
Concessão
A concessão da Celg vence em 2015, segundo contrato assinado em 2000. A União estuda renovar até 2035 os contratos com concessionárias de todo o País, mas ainda não há decisão a respeito.
A Lei número 8.987, de 1995, estabelece que a declaração de caducidade pode ocorrer em caso de falhas da concessionária na execução do contrato, como descumprimento de cláusulas, perda de condições econômicas para manter a adequada prestação de serviços, inadimplência e descumprimento de penalidades impostas.
A lei ainda determina que, declarada a caducidade, não caberá à União qualquer responsabilidade sobre encargos, obrigações ou compromissos com terceiros e empregados da concessionária.
A Celg tem cerca de 7,5 mil funcionários. Os termos da lei que trata da caducidade foram incluídos no relatório entregue à direção da companhia no mês passado.