Antigamente, era lugar comum falar-se nas "águas de março fechando o verão", tal como na música de Tom Jobim que Elis Regina ajudou a imortalizar. Hoje, quem sabe quando cessarão - se é que estancarão - as águas copiosas do verão, tão ameaçadoras por causa dos nossos modos irracionais de ocupar os espaços urbanos, impermeabilizar o solo, atravancar margens de rios, construir em encostas e topos de morros sujeitos a deslizamentos?
Dois estudos publicados há poucas semanas na conceituada revista Nature dizem que as chuvas este ano no mundo provavelmente serão mais volumosas que as de 2010, que tantos dramas trouxeram em toda parte. Pode-se olhar aqui mesmo no Brasil - o Centro-Oeste a perder safras, as tragédias da serra fluminense, partes do Maranhão e Piauí, de novo a serra catarinense e outras áreas do Sul do País etc. Em Ilhota, por exemplo, o município de Santa Catarina mais atingido em 2008 (135 mortos), este ano com chuvas intensas se perderam 70% das obras de infraestrutura refeitas desde então. Porque em uma hora caíram 200 milímetros de chuva (em 2008 foram 500 milímetros em três dias), que evidenciaram não havermos ainda nos convencido de que temos de mudar - reforçar - nossos padrões de construção urbanos e rodoviários.
Já a revista Science traz estudos segundo os quais a seca de 2010 na Amazônia foi mais intensa que a de 2005, até aqui considerada a pior em um século. Nada menos de 8 bilhões de toneladas de dióxido de carbono foram emitidos pela região de florestas - mais que todas as emissões anuais dos Estados Unidos, acima de 5 bilhões de toneladas -, num ano em que a temperatura foi muito influenciada pelo aquecimento das águas do Atlântico. Foram 250 mil mortes por "desastres naturais" no ano, adverte o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon. Christiana Figueres, a secretária da Convenção do Clima, lembra que só em 2008 pelo menos 20 milhões de pessoas foram deslocadas pelos desastres. Nos próximos 40 anos, poderão ser até um bilhão, se não houver ajuda dos países mais ricos.
Mas esse mundo, que em uma década aumentou em 50% suas despesas com armamentos, não consegue cumprir as promessas de reduzir as emissões que intensificam mudanças do clima. Em 2009, elas se mantiveram praticamente no mesmo nível, principalmente porque a China aumentou suas emissões em 13%, um aumento equivalente às emissões conjuntas da Alemanha, Grécia e Peru - e quase tudo por causa de mais uso de carvão para gerar energia. A Índia também aumentou as suas e já está em terceiro lugar entre os países emissores. Se nada for feito para mudar o panorama, até 2030 as emissões dobrarão, quando se considera indispensável reduzi-las em 80% até 2050 (para impedir que a temperatura planetária suba mais de dois graus). E os países em "desenvolvimento" serão responsáveis por 70% das emissões.
Seja como for, diz o Asian Development Bank, os países da Ásia e do Pacífico têm de preparar-se para migrações em massa por causa do clima e do agravamento de tufões, ciclones, inundações, secas etc. Sem falar em que o aquecimento das águas, que favorece a proliferação de algas tóxicas, levará em toda parte à multiplicação descontrolada de micróbios e bactérias que transmitem doenças.
E ainda não é tudo. Luc Guacadje, secretário-executivo da Convenção sobre Desertificação, alerta que mais secas e desertificação - como está acontecendo - ameaçam a segurança alimentar no mundo, pois desde 1950 nada menos de 1,9 bilhão de hectares se degradaram, quando o mundo precisará de 70% mais de alimentos até meados do século - e hoje 44% deles já se produzem em terras secas, nas quais se encontra quase metade de mais de um bilhão de pessoas que vivem abaixo da linha de pobreza.
Números catastróficos não mudam as lógicas financeiras que continuam a conduzir o mundo e a gerar efeitos devastadores. Onde estão os US$ 30 bilhões prometidos pelos países industrializados na Convenção do Clima em Copenhague (2009), para ajudar os países mais pobres até 2012? E os US$ 100 bilhões anuais prometidos até 2020? Não saíram do papel.
O Brasil mesmo precisa de US$ 400 bilhões até 2030 para reduzir suas emissões e cumprir o que prometeu na convenção, diz o Banco Mundial. Mas onde estão esses recursos? Não se consegue nem mesmo o dinheiro para tirar as pessoas de áreas que têm alta probabilidade de ser atingidas por catástrofes climáticas. A cidade de São Paulo diz que em seis anos o fará. Mas como, se o Instituto de Pesquisas Tecnológicas aponta 115 mil pessoas em áreas de "alto risco", 500 mil em "áreas críticas", mais de um milhão se somadas também as que ocupam área de preservação permanente? E a intenção da prefeitura paulistana é de retirar, até junho próximo, só 1.132 famílias das áreas mais perigosas; e até 2027, pouco mais de 27 mil famílias.
Também se pode perguntar: e Goiânia, que fará? A cada chuva, os olhos se erguem para os céus - em busca não apenas de sinais do tempo mais tranquilizadores, mas também de uma ajuda da Providência, diante das águas de março e do ano todo. Correndo ainda o risco de ser acusado de "profeta do apocalipse" quem adverte para a gravidade da situação e a necessidade de urgência nas políticas.
E não bastassem essas coisas, ainda vêm terremotos, tsunamis e seu corte de desgraças...
Washington Novaes é jornalista
Fonte: Jornal O Popular
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