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353 anos para atender a população

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18/10/2010
Deire Assis
 
Segunda maior cidade de Goiás, Aparecida de Goiânia tem um dos piores índices de cobertura de água e esgoto. A situação de calamidade levou o Ministério Público estadual a ajuizar uma ação civil pública não só contra a Saneamento de Goiás S/A (Saneago), mas também contra a própria Prefeitura de Aparecida, o Estado de Goiás e a Agência Goiana de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos (AGR) para que o quadro seja revertido no menor espaço de tempo possível. Com base em informações fornecidas pela própria Saneago ao Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento (SNIS) em relação aos investimentos da estatal no município entre 2000 e 2008 e considerando a taxa de crescimento populacional atual de Aparecida, a universalização dos serviços de água e esgoto na cidade só ocorreria em 353 anos.
 
De acordo com os dados do SNIS, em oito anos, a Saneago teria investido o equivalente a R$ 13,6 milhões em saneamento na cidade de Aparecida, média de R$ 1,5 milhão anual. Para ter ideia do quanto o valor difere das atuais necessidades de ampliação do atendimento nesta área no município, o plano municipal de saneamento básico elaborado pela Prefeitura de Aparecida exigirá investimentos da ordem de R$ 780 milhões em obras, sendo cerca de R$ 536 milhões nos próximos seis anos. Ou seja, o equivalente a quase R$ 90 milhões anuais ou cerca de 60 vezes mais que os investimentos atuais da estatal na cidade.
 
Antigos e sem água
De acordo com o promotor de Justiça que assina a ação, Élvio Vicente da Silva, da 9ª Promotoria de Defesa do Consumidor de Aparecida de Goiânia, há bairros com mais de 30 anos de existência na cidade e que não contam, sequer, com rede de água tratada. É o caso de setores como Bairro Cardoso 1 e Bairro Hilda. Na ação, o promotor anexa laudos de análises da qualidade da água consumida em Aparecida, realizados pelo Laboratório de Saúde Pública Dr. Giovanni Cysneiros (Lacen-GO). "Os laudos enviados pelo oratório à promotoria são preocupantes. Cerca de 60% da águas de Aparecida são consideradas impróprias para o consumo", sustenta o promotor.
 
Para fundamentar a ação civil pública, o promotor tomou declarações de representantes de 82 bairros de Aparecida. Segundo os relatos colhidos pelo promotor Élvio, os moradores da cidade são obrigados a conviver com inúmeros problemas, como o mal cheiro das fossas; doenças e mortes em razão da água contaminada ingerida das cisternas e descontinuidade no fornecimento de água. "As reclamações não param de aparecer", diz o promotor, que pediu à Justiça a fixação do prazo de dois anos para que o problema seja solucionado no município.
 
Os cerca de 2 mil moradores do Setor Morada dos Pássaros, por exemplo, não contam com rede de abastecimento de água e coleta de esgoto, ocasionando inúmeros problemas de saúde à população. Onde há fornecimento de água, os moradores se queixam de que ela chega às torneiras suja, barrenta, turva, imprópria para o consumo. No Mansões Paraíso, a constante falta de água comprime o ar nas redes, fazendo com que o medidor continue fazendo leituras mesmo que não haja consumo, elevando a conta no fim do mês. Em alguns bairros, como no caso do Jardim Riviera, os moradores chegaram a ficar 15 dias sem água, recentemente.
 
Segundo relato de representantes dos moradores do Setor Solar Central Park, as crianças são obrigadas a levar água mineral para a escola devido à má qualidade da água fornecida pela Saneago. Ao ser ouvida pelo promotor Élvio no inquérito que antecedeu a ação civil pública, a presidente do bairro, Anadira Carvalho Luz, estima que cada família gaste em média cinco galões de água mineral por mês para o consumo, onerando as despesas mensais. "Não se pode admitir e nem permitir que os cidadãos permaneçam, por cinquenta anos, com um serviço de necessidade pública mal executado", analisa o promotor.
 
Por causa desse cenário, "grande parte da população de Aparecida é obrigada a conviver com ratos, baratas e mosquitos, entre outros insetos oriundos das fossas que são abertas pelos próprios moradores, em razão da falta de uma adequada rede de coleta de esgoto", afirma o promotor de Justiça Élvio Vicente. "Além do dano ambiental e à saúde provocados, o lançamento de resíduos líquidos domésticos e industriais no meio ambiente torna a água imprópria para o consumo", alerta.
 
Cisternas e fossas são realidade em setores
 
Cerca de R$ 30 mensais é o gasto da família da dona de casa Eleonora Lopes da Silva, de 28 anos, com a compra de galões de água mineral para o consumo em casa. Ela, que mora há cinco anos com o marido, Francisco Valmir, 27, e os três filhos pequenos, Conrado, 2, Gustavo, 4 e Taís Cintra, de 9 anos, no Setor Campos Elísios, em Aparecida Goiânia, sonha com o dia em que não precisará mais fazer uso da cisterna e da fossa séptica em casa.
 
"Mas pelo jeito, vai demorar", diz, desanimada, sobre a possível data para construção da rede de abastecimento de água e esgoto no bairro. Enquanto o sonho não se realiza, a dona de casa vive preocupada com a saúde das crianças, principalmente. Mesmo sem fazer uso da água da cisterna, os filhos apresentam frequentes problemas de saúde, especialmente diarreias. Antes de mudar-se com a família para o Campos Elísios, Eleonora vivia na Cidade Vera Cruz, onde também não era servida com água e esgoto.
 
O mesmo ocorre no Setor Morada dos Pássaros, onde mora a comerciante Ana da Silva Damásio, de 56 anos. Há um ano no bairro, Ana tem gastos extras com a limpeza e manutenção da cisterna. Para consumir a água de lá, a comerciante filtra o produto e até coa com um pano. "Mas sabemos que não é o ideal. O que a gente deseja mesmo é ter água servida, como qualquer outro cidadão", afirma.
 
A mulher aluga uma casa no bairro e tem outro imóvel no Setor Pontal Sul. "Lá chegaram a abrir o asfalto para passar a rede, mas foi só."
 
Associação defende as parcerias com empresas
Vice-presidente da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Newton Lima Azevedo defende as parcerias público privadas como única alternativa para universalização do acesso a abastecimento básico no Brasil. "Em hipótese nenhuma isso ocorrerá apenas com investimentos públicos ou somente com recursos privados", sustenta.
 
Azevedo cita cifras como R$ 13,5 bilhões em investimentos anuais, durante 20 anos, como necessários para se alcançar a universalização dos serviços. "Somente de 20% a 30% desse recurso pode ser alocado com o poder público. Ou seja, a defesa das parcerias não é uma defesa ideológica, mas pragmática", diz o vice-presidente da Abdib.
 
O presidente da Saneamento de Goiás S/A (Saneago), Nicomedes Domingos Borges, informa que há um volume grande de investimentos da empresa visando a ampliação dos serviços de água e esgoto, mas admite que eles ainda não insuficientes para cobrir uma enorme demanda reprimida, sobretudo por serviços de coleta e tratamento de esgoto. "Por isso convidamos prefeitos, promotores, sindicatos dos servidores, empresários e todos os interessados para discutir o assunto nesta audiência pública."
 
De acordo com o presidente da Saneago, o abastecimento de água não preocupa a empresa. "Com a conclusão das obras do João Leite, vamos atender a contento a região metropolitana de Goiânia. O problema é o esgoto." A situação é mais grave neste quesito, ressalta Borges, em Aparecida e Luziânia esta no Entorno do Distrito Federal. "Houve uma espécie de apagão em investimentos para construção de redes coletoras de esgoto porque a prioridade era o abastecimento de água."

Fonte: Jornal O Popular

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