Deire Assis
Uma audiência convocada pela diretoria da Saneamento de Goiás S/A (Saneago) para amanhã, às 9 horas, na sede do Ministério Público (MP) estadual, representa o movimento mais explícito da estatal em três décadas como concessionária dos serviços de água e esgoto sanitário no Estado na busca de saídas para universalização do atendimento da população nesta área. O encontro resulta, em parte, da crescente pressão exercida pelas prefeituras para que a empresa demonstre condições de atender à demanda crescente por saneamento nas áreas urbanas, sobretudo de coleta e tratamento de esgoto - serviços disponíveis a menos de 40% da população goiana - sob pena de rescindirem os contratos de concessão firmados com a estatal.
Em períodos de escassez de chuva, o cenário de caos se escancara. Foi justamente durante a crise da falta d´água experimentada por vários bairros da capital e de Aparecida de Goiânia, há poucos dias, que o edital convocando para a audiência pública foi publicado pela Saneago. O encontro, segundo informa o próprio edital, "discutirá modelos de parcerias público privadas visando a universalização dos serviços de esgoto sanitário em Anápolis, Aparecida de Goiânia, Rio Verde e Trindade", alguns dos municípios que enfrentam sérios problemas no setor. Esse tipo de parceria foi adotada em vários municípios brasileiros com o objetivo de ampliar o número de famílias atendidas com água e esgoto, tendo em vista as dificuldades das estatais para investir em obras de infraestrutura de saneamento básico. Calcula-se que exista hoje, no País, quase 70 operações dessa natureza em municípios localizados em todas as regiões do País.
As cidades de Aparecida, Trindade, Anápolis e Jataí, atendendo ao que preconiza a Lei 11.445/2007 - marco regulatório das questões relacionadas a saneamento no Brasil, que inclui, além de água e esgoto para todos, definições e atribuições para execução dos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e drenagem e manejo de águas pluviais -, são algumas das que elaboraram seus planos municipais de saneamento básico. Os planos, segundo prevê a legislação atual, deveriam ser elaborados por todas as prefeituras até dezembro desse ano. Os documentos contêm metas ousadas de investimento em infraestrutura para que a universalização do atendimento de toda a população dessas cidades ocorra em até seis anos.
Considerando apenas as quatro cidades, o cumprimento destes planos resultaria na necessidade de investimento, por parte da Saneago, de R$ 1,5 bilhão em 30 anos, sendo R$ 1,1 bilhão nos primeiros seis anos de execução dos futuros contratos. Sem capacidade de endividamento, no entanto, a empresa tem sérios problemas de caixa para investir, sobretudo, na ampliação das redes de coleta e tratamento do esgoto. A situação penaliza os moradores das maiores cidades de Goiás, como é o caso de Anápolis e Aparecida de Goiânia, e se agrava com grande velocidade nas demais cidades das regiões metropolitanas de Goiânia e do Distrito Federal, onde o crescimento populacional ocorre de forma muito mais acelerada que na média das demais regiões metropolitanas do Brasil.
Novo contrato
Secretário da Fazenda do município de Aparecida de Goiânia, Carlos Eduardo de Paula Rodrigues lembra que em 2005 o ex-prefeito da cidade, José Macedo, renovou o contrato que tinha com a Saneago entregando a concessão dos serviços de saneamento à estatal por mais 30 anos. De acordo com o secretário, nesses cinco anos, a Saneamento de Goiás investiu menos de 20% dos recursos previstos no contrato. "Ou seja, a Saneago não honrou o contrato e está inadimplente com a população de Aparecida", ataca o secretário.
Diante desse cenário, o município contratou uma empresa para elaborar um novo plano de saneamento e apresentou os termos à concessionária. "Sentimos grande dificuldade da empresa em cumprir as exigências do plano e um corporativismo exacerbado dentro da empresa. O dono da concessão é a prefeitura e isso precisa ficar claro. Não podemos mais tolerar que a população de Aparecida de Goiânia seja penalizada dessa forma, pagando caro por um serviço muito ruim", critica o secretário Carlos Eduardo.
Cobertura cai
Conforme explica o secretário, nos últimos dois anos, caiu de 17% para menos de 15% o porcentual da população do município atendido com coleta de esgoto sanitário, o que mostra piora do quadro nos últimos anos. Carlos Eduardo confirma que o município trabalha hoje com duas hipóteses. Uma delas é a permanência da concessão nas mãos da Saneago, desde que a empresa comprove condições de cumprir com as metas de universalização dos serviços de água e esgoto no município. A outra é a retomada da concessão pela prefeitura e abertura concorrência pública. pública para exploração dos serviços. "Temos escutado todos os dias que a Saneago não pode abrir mão de Aparecida porque senão não conseguirá sequer honrar a folha de pagamento dos 6 mil funcionários da empresa. Nos espanta ver que, para alguns, o interesse corporativo está acima do interesse de uma população de mais de 530 mil habitante", sustenta.
Concessão vencida e chance de rompimento
A existência de um contrato de concessão para fornecimento de água e esgoto já vencido entre a Saneamento de Goiás S/A (Saneago) e a Prefeitura de Trindade, o município pode ser um dos primeiros a abrir concorrência para contratar nova concessionária para assumir o setor. Com 120 mil habitantes, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o município conta com 38% de cobertura em coleta de esgoto e 75% em abastecimento de água.
O prefeito, Ricardo Fortunato (PMDB), sustenta que há necessidade de investimentos da ordem de R$ 140 milhões em Trindade para que a universalização no acesso a saneamento básico ocorra na cidade. "Estamos avaliando a capacidade de investimentos da Saneago, mas achamos, de fato, bem difícil, que ela permaneça com a concessão nas mãos", adianta o prefeito.
"Sou amigo pessoal do presidente da Saneago e respeito a empresa, mas não podemos continuar com situação tão ruim no município", frisa.
Ricardo Fortunato afirma que o plano municipal de abastecimento elaborado pelo município estabelece um cronograma funcional de investimentos. "Pretendemos que 100% da população conte com os serviços no prazo de um ano. Sem capacidade de endividamento, a Saneago dificilmente conseguirá assumir esse compromisso."
Tarifa
O prefeito sustenta ressalta, ainda, que a audiência que será realizada amanhã em Goiânia ocorre em momento bastante oportuno. "Há várias discussões a serem realizadas nesse sentido, inclusive quanto às tarifas aplicadas pelos concessionários. Não podemos sequer cogitar aumento da tarifa de água e esgoto, por exemplo, caso a Saneago faça opção por uma parceria público privada no município de Trindade", cobra o prefeito. No caso de Trindade, o martelo será batido em poucos dias.
Fonte: Jornal O Popular