Depois do sétimo ano do governo Lula, o Brasil ainda tem 40 milhões de pessoas (a população da Argentina inteira) vivendo sem acesso à água potável. Dos 190 milhões de brasileiros, 80 milhões pagam pela água tratada, mas não podem bebê-la. Segundo dados do Ministério das Cidades, mais de cem milhões de brasileiros também não têm rede de esgoto. Com isso, dez crianças morrem por hora pela falta de saneamento e 60% das internações hospitalares infantis estão relacionadas com o problema. Os adultos também padecem com doenças sanitárias, as chamadas doenças da pobreza.
Para o presidente do Instituto Trata Brasil, o engenheiro Raul Graça Couto Pinho, o país deverá levar mesmo pelo menos 30 anos para "tirar o povo da merda", nas palavras do presidente Lula . Ele dividiu os R$ 270 bilhões que o Ministério das Cidades disse que precisarão ser gastos para universalizar o acesso a esgoto tratado e água potável pelos os investimentos previstos pelo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) para saneamento básico.
- O Brasil está na "m" - disse Pinho. - É o sétimo país no ranking da vergonha, com menos banheiros no mundo. De 1986, quando acabou o BNH, até 2003, quando fizeram o Ministério das Cidades, ficamos sem política de saneamento. O país vive um novo momento, mas, ainda assim, vamos levar 30 anos.
40% da água é jogada fora
Já Wanderley da Silva Paganini, professor do Departamento de Saúde Ambiental da Faculdade de Saúde Pública da USP, estima que o Brasil deverá gastar pelo menos 80 anos para universalizar o acesso a água e esgoto. A solução, segundo ele, é investir em obras "a fundo perdido".
- Sem investimento a fundo perdido, isso de 30 anos não existe. Não pense que 89% da população tem água potável. Pense: que tipo de água 11% dos brasileiros bebem neste país?
Para Raul Graça Couto, o PAC e a lei do saneamento básico, promulgada em 2007, ampliaram o acesso para água e esgoto, mas "o cenário ainda é horrível". O Instituto Trata Brasil tem encomendado, regularmente, pesquisas da FGV para avaliar o acesso ao saneamento básico. No primeiro estudo, em 2007, a estimativa para universalizar o saneamento era de 115 anos, o que significava que só teríamos água e esgoto nos 300 anos da independência, em 2122.
- Hoje, metade da população não tem rede de esgoto e só um terço do esgoto do país é tratado. E não é só questão de termos mais recursos para fazer as obras. Além disso, precisamos conter o desperdício. Cerca de 40% da água é jogada fora.
Estudo da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib) mostra que entre 2003 e 2008 o volume de investimento aplicado em saneamento oscilou entre R$ 3,4 bilhões e R$ 4,8 bilhões por ano. Mesmo reconhecendo que há trajetória crescente de investimentos do setor, a entidade considera que o volume ainda é insuficiente diante da necessidade de aplicar R$ 13,5 bilhões anualmente, e durante longo tempo.
- Nos últimos anos, os investimentos realizados, ou seja, recursos que viraram obras, tubos e redes de esgoto para a população, aumentaram de R$ 2,7 bilhões em 2003 para R$ 6 bilhões este ano. A necessidade de investimento anual, no entanto, é de R$ 13,5 bilhões, ao longo de vários anos, para termos condições de alcançar a universalização dos serviços. O setor de saneamento básico é o mais carente de investimento - diz o presidente da Abdib, Paulo Godoy.
Investimento reduz doenças
Segundo ele, os investimentos em saneamento trazem "impactos extremamente positivos" para a economia e a saúde.
- Depois da retomada dos investimentos nos últimos dois ou três anos, a quantidade de internações de crianças por causa de doenças causadas pela falta de saneamento começou a cair. O Brasil registrava a internação de cerca de 1.000 todos os dias por doenças relacionadas a condições insuficientes de saneamento básico e higiene. Esse indicador foi reduzido em cerca de 20% - afirma Godoy.
A falta de condições adequadas de atendimento da população, conforme o estudo da Abdib, de julho deste ano, atinge 95,6 milhões de pessoas no serviço de coleta de esgoto e 34 milhões de pessoas no de abastecimento de água, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada em 2007. O prejuízo, garante o documento, recai sobre os mais pobres, que representam 62% daqueles que não têm coleta de esgoto e 71% entre os que não são servidos por abastecimento de água. Enquanto a infraestrutura não avança no ritmo desejável, multiplicam-se casos de internações no sistema de saúde devido a doenças sanitárias, com 800 internações diárias.
Fonte: Blog do Paulo Nunes